Em 1982 aconteceu o inusitado (e nunca desejado). Quando morava no Rio de Janeiro e procurava emprego, costumeiramente dizia aos amigos que jamais faria duas coisas: morar em Brasília e ser cristão. Eram decisões minhas, havia me esquecido de combinar isso com Deus. Mudei-me para Brasília a fim de criar e instalar a filial de uma empresa carioca. Na verdade, eu queria fugir da PM. Explico. Estava desempregado, pensando em ficar noivo, e havia passado em um concurso para ser da Polícia Militar quando recebi o convite da tal empresa. O convite veio no momento certo porque não queria ser PM e tentei aplicar um golpe na minha família. Pensei “Vou, dou satisfação pra todo mundo, e volto dois ou três meses após passar a prova final do concurso”. Até tentei fazer tudo isso mas não deu certo. Desde então vivo em Brasília, o namoro do RJ acabou, etc. É, o coração do homem pode fazer planos, mas a resposta certa…
O início da vida na capital foi realmente duro, solitário, mas hoje vejo que foi de grande aprendizado. A vida cultural em Brasília sempre foi intensa e aos poucos já estava bem familiarizado com o meio artístico. Não me recordo como mas fui convidado para cantar no coral Desediano, do Banco do Brasil, e de lá, também não me lembro como, passei a integrar um grupo de teatro, o Grupo Martins Penna. No RJ eu já havia feito algumas peças estudantis mas foi com esse grupo que realmente comecei a aprender um pouco dessa arte. Para sorte minha o diretor era o Murilo Ekardt e havia um ator sem igual, Gê Martu, sobre quem acabei por fazer um longa documentário em 2018. O grupo era muito profissional e estávamos ensaiando pra encenar a peça Chapéu de sebo. A estreia seria em fevereiro de 1983, começamos a ensaiar em novembro e não paramos de ensaiar nem para o Natal e fim de ano. A produção era ótima, mas descobri na pele que a Capital do país sofre em escala o que acontece em todo país: valorizamos a arte… desde que ela não seja de um grupo local. Éramos mais de 20 pessoas envolvidas entre técnicos e atores, e não foram poucas as vezes que atuamos pra uma plateia de 2 ou 3 pessoas. Reconheço, fomos ousados. Resolvemos fazer a temporada mesmo sabendo que Brasília não tinha público suficiente para suportar tão ousada iniciativa. Valeu a experiência e aprendizado.
Enquanto tudo isso transcorria o segundo fato inusitado aconteceu: virei cristão (ou evangélico como muitos gostam de chamar). Prova de que tudo à partir daí seria melhor é que a Ranúzia. Sim, Ranúzia é o melhor exemplo desse marco na minha vida. Ela já tinha alguma vivência artística porque cantava e dirigia corais em sua igreja e também já havia atuado em uma peça (O Rei do mundo) escrita e dirigida pelo seu pai. Ao mesmo tempo que seguia uma carreira artística regular também comecei a fazer peças que professavam minha fé. Nesse tempo dirigi e atuei nas peças O Rei dos reis, Resplandeceu-lhes a luz e Jugo desigual.