
Escritores Brasileiros – 2004
A Crisalis Editora lançou um concurso nacional, em que o prêmio era participar do livro cujo título era “Escritores Brasileiros”, e continha uma mostra da poesia de novos talentos no cenário nacional. Inscrivi a poesia Pivete e fui agraciado com a publicação da mesma.

Monólogo de um Pescador
MONÓLOGO DE UM PESCADOR
João Inácio
Olha mar, vim aqui te dizer
que não vou voltar a pescar.
Não vou mais querer pegar
aquele velho peixe que tanto sonhei pescar.
Pensei que pescar fosse o meu velho destino.
Um destino onde pescador e peixe
se alimentariam e muitas vezes,
se matam.
Há quem diga que é loucura
querer impedir que este pescador
goste de sair para pescar.
Mas chega uma hora que ele cansa e chora,
por não pegar um peixe maior que seu próprio mar.
Acreditei que não era errado querer mudar o rumo do mar.
Que não era errado querer sorrir com a pureza de quem
gosta de ver a lua se espelhando nas águas do mar.
Errado é esperar e ver o tempo passar.
É poder, saber fazer e ficar vendo o sonho calar.
É mirar os horizontes com os olhos mortos.
É sequer buscar o sonho que sempre sonhei.
Olha mar,
vim aqui te dizer que não vou voltar a pescar
aquele velho peixe que tanto sonhei pescar.
Cansei de dar murro em ponta de faca
e esperar que ao menos a faca mudasse seu corte.
Cansei de cortar minha mão pescando um peixe
maior do que posso pescar.
Cansei, porque o que esperava,
era que duas outras mãos
me ajudassem a tirar um grande sonho do mar.
Estou cansado e, como tantos, chego a me perguntar:
será que existe peixe? Será que existe mar?
Talvez seja este o segredo!
Talvez este peixe só saia do mar
pelas mãos do Senhor do mar.
Quantas vezes gritei e pedi sua ajuda.
É duro ver que o peixe não vem.
É duro ver que o peixe segue para o norte
e você guia meu barco para o sul.
Por tudo isso mar, é que eu não vou voltar a pescar
aquele velho peixe que tanto sonhei pescar.
Já não quero lançar a linha
até não ter mais linha na mãos.
Pescar peixes pequenos, tolos, ingênuos,
peixes que só eu consegui pescar.
Vim pra te dizer que estou
até sem forças pra voltar a pescar.
A dor calou a vontade de ter o peixe nas mãos.
Acabou o vigor de poder ir e voltar do mar.
Mas se você leva meu barco para o sul,
um lugar onde nunca quis estar.
Um horizonte tão longe
do sonho que um dia sequer pedi pra sonhar,
contra você meu Deus,
você que e o meu “Grande Mar”,
não tenho razão e nem coragem de lutar.
Não há quem verdadeiramente se banhe em suas águas
e esqueça do vigor que só o seu sal pode trazer.
Por isso, Jesus, você que e o meu grande “mar de amar”.
Mesmo ilhado nos cais dos fracassos,
em mim o pouco que resta é a luz da Sua esperança.
Espero que talvez assim, indo no rumo da sua maré,
indo como uma pedra que cai até o fundo do mar,
eu compreenda que e melhor estar só com você.
Talvez estando nu e morto, bem dentro do mar,
eu me encontre profundamente e eternamente com você.
vazio de sonhos, cheio de lágrimas e pleno de você.
Pivete
Pivete
Netinho
Esse filho não é meu
e não é seu.
Nasceu quase que por acaso
ou um simples
aborto da natureza.
Quando criança,
apesar da pobreza,
se sentiu criança e
a fome não doía tanto
quanto na teoria.
Pois seus sonhos
infantis e imaturos
(como os nossos)
enchiam
suas grandes barrigas
(como as nossas).
Na adolescência,
foi sozinho demais
pra sentir solidão.
Amor?
Só em revista
que as via,
mas não as lia.
Embora nunca tivesse,
por consequência,
lido livros,
viveu a história do
“Feijão e o Sonho”
ao pé da letra.
Quando adulto,
viveu fazendo e,
por vezes,
tirando vidas.
Mesmo sendo adulto,
viveu sonhos e sonhos.
Hoje,
o menino-homem,
que voa sem ser passarinho,
passou pro outro lado,
todo lambuzado
com balas pelo corpo.
Desculpe-me,
esse filho foi seu
e foi meu.